sexta-feira, janeiro 18, 2019


Quero ir aonde ninguém quer, Jesus! Que saudades do Bairro do Barruncho…




É com um sorriso rasgado e com os olhos a brilhar que a M. nos recebe na sua casa. A demência não lhe permite ter plena noção de tudo o que faz, mas ela sabe que aquele dia é especial. Há muito que a M. pedia à família para que o padre fosse a sua casa, uma barraca num bairro pobre. Já não conseguia dizer coisa com coisa, mas sabia que o padre estava ali. Só falava crioulo e mal se entendia, mas o seu sorriso dizia tudo.

Este foi dos momentos que mais me marcaram no Bairro do Barruncho, onde entrei pela primeira vez com os Missionários Combonianos. Já lá vão uns anos, mas é impossível esquecer aquela terra de missão, como gosto de dizer. Vivi momentos muito duros, fui a funerais, vi muito sofrimento… Não me esqueço também do frio que se entranhava nos ossos enquanto dávamos explicações às crianças dentro daquelas barracas, onde nenhum ser humano devia viver. Não me esqueço também do esgoto no largo onde as crianças costumavam brincar…

Mas todos esses momentos menos bons não ofuscam o sorriso da M. e de todas aquelas crianças… O Barruncho mostrou-me a beleza de Deus no meio da pobreza, no meio daqueles que ninguém quer e que são estigmatizados e rejeitados pela sociedade. Pessoas como eu e tu… Filhos de Deus, nossos irmãos em Cristo. Pessoas que nos habituamos, mesmo inconscientemente, a colocar do outro lado. Eles e nós… Como se isto fizesse algum sentido…

Foi dos sítios onde mais li a Bíblia na vida de cada irmão em Cristo. Mesmo quando o cansaço quase me derrubava, sentia os braços de Jesus a erguerem-me… Percebia claramente que Jesus me dizia: “É aqui, junto de quem ninguém quer, que te peço ajuda!”

Ainda ontem senti isso ao encontrar a F. no Hospital, onde trabalha. Mais uma vez o meu coração se sentiu apertado de tantas saudades que tenho desses tempos do Barruncho… Mais uma vez disse a Jesus: “Sim, leva-me até quem ninguém quer, aos lugares onde fazes mais falta, aos lugares onde a exclusão social não tem que ter a última palavra…”

Aqui, estou, Jesus! Não sei o que me espera, só sei que essa é a Tua vontade! Senti isso desde o primeiro dia que entrei no Barruncho, senti isso no dia do acidente e sinto cada vez mais a cada dia que passa… Molda-me, como barro, e conduz-me onde precisas da minha ajuda! Ámen.


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